sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Geni e o Zepelin

Geni e o Zepelin

Essa música de Chico Buarque

retrata o canalhismo da Humanidade


De tudo que é nego torto

Do mangue e do cais do porto

Ela já foi namorada

O seu corpo é dos errantes

Dos cegos, dos retirantes

É de quem não tem mais nada

Foi assim desde menina

Das lésbicas concubina

Dos pederastas, amásio

É a rainha dos detentos

Das loucas, dos lazarentos

Dos moleques do internato

E também vai amiúde

Com os velhinhos sem saúde

E as viúvas sem porvir

Ela é um poço de bondade

E é por isso que a cidade

Vive sempre a repetir"

Joga pedra na Geni

Joga pedra na Geni

Ela é feita pra apanhar

Ela é boa de cuspir

Ela dá pra qualquer um

Maldita Geni"

Um dia surgiu, brilhante

Entre as nuvens, flutuante

Um enorme Zepelim

Pairou sobre os edifícios

Abriu dois mil orifícios

Com dois mil canhões assim

A cidade apavorada

Se quedou paralisada

Pronta pra virar geléia

Mas do Zepelim gigante

Desceu o seu comandante

Dizendo: "mudei de idéia

Quando vi nesta cidade

Tanto horror e iniqüidade

Resolvi tudo explodir

Mas posso evitar o drama

Se aquela formosa dama

Esta noite me servir"

Essa dama era a Geni

Mais não pode ser Geni

Ela é feita pra apanhar

Ela é boa de cuspir

Ela dá pra qualquer um

Maldita Geni

Mas de fato, logo ela

Tão coitada e tão singela

Cativara o forasteiro

O guerreiro tão vistoso

Tão temido e poderoso

Era dela prisioneiro

Acontece que a donzela

E isso era segredo dela

Também tinha seus caprichos

E a deitar com homem tão nobre

Tão cheirando a brilho e a cobre

Preferia amar com os bichos

Ao ouvir tal heresia

A cidade em romaria

Foi beijar a sua mão

O prefeito de joelhos

O bispo de olhos vermelhos

E o banqueiro com um milhão"

Vai com ele, vai, Geni

Vai com ele, vai, Geni

Você pode nos salvar

Você vai nos redimir

Você dá pra qualquer um

Bendita Geni"

Foram tantos os pedidos

Tão sinceros, tão sentidos

Que ela dominou seu asco

Nesta noite lancinante

Entregou-se a tal amante

Como quem dá-se ao carrasco

Ele fez tanta sujeira

Lambuzou-se a noite inteira

Até ficar saciado
E nem bem amanhecia

Partiu numa nuvem fria

Com seu Zepelim prateado

Num suspiro aliviado

Ela se virou de lado

E tentou até sorrir

Mas logo raiou o dia

E a cidade em cantoria

Não deixou ela dormir"

Joga pedra na Geni

Joga bosta na Geni

Ela é feita pra apanhar

Ela é boa de cuspir

Ela dá pra qualquer um

Maldita Geni"

(Chico Buarque de Hollanda)



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